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Considerado uma espécie invasora, suíno causa prejuízos aos produtores da região. Ao analisar 55 paisagens no nordeste paulista, pesquisadores observaram maior número de mamíferos nativos em locais com vegetação preservada e onde há culturas agrícolas variadas; cenário mais prejudicial foi de monocultura
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Considerado uma espécie invasora, o suíno tem causado prejuízos aos produtores na região. Em uma análise de 55 paisagens no nordeste paulista, os pesquisadores notaram um maior número de mamíferos nativos em locais com vegetação preservada e culturas agrícolas variadas. O cenário mais prejudicial foi observado em áreas de monocultura.
André Julião | Agência FAPESP – Nada substitui o Cerrado nativo, mas em uma região agrícola consolidada como o nordeste do Estado de São Paulo, a substituição de grandes áreas de monocultura por lavouras diversificadas pode ter efeitos benéficos para os mamíferos ainda presentes nessas áreas. Além disso, essa prática auxilia no controle de espécies invasoras, como os javalis, que causam prejuízos aos produtores rurais.
Essa é uma das conclusões de um estudo publicado no Journal of Applied Ecology por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) com apoio da FAPESP.
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O estudo analisou a presença de mamíferos nativos e exóticos em 55 paisagens de 200 hectares, verificando a cobertura do solo em 3 mil hectares ao redor de cada uma. No total, a área de estudo abrangeu cerca de 34 mil quilômetros quadrados, incluindo aproximadamente 80 municípios paulistas.
Entre 2017 e 2018, o grupo percorreu cada uma das paisagens em busca de rastros deixados pelos mamíferos, como pegadas, fezes e outros sinais, além de instalar câmeras em áreas de vegetação nativa.
“As paisagens tinham composições mais ou menos heterogêneas, com porções de vegetação nativa, monocultura e lavouras diversas. Dessa forma, conseguimos correlacionar o grau de heterogeneidade da paisagem com a presença ou ausência de mamíferos nativos e exóticos”, explica Marcella do Carmo Pônzio, primeira autora do artigo, atualmente doutoranda no Instituto de Biociências (IB) da USP.
O impacto da heterogeneidade da paisagem foi equivalente a 80% do efeito que as áreas de Cerrado da região têm sobre o número de espécies nativas. Além disso, a diversificação da cobertura do solo reduziu em 27% a quantidade de espécies invasoras, como o javali.
“Ainda que espécies mais sensíveis, como a onça-pintada, tenham desaparecido, uma maior complexidade da paisagem pode proporcionar mais espécies nativas, como onças-pardas e tatus, por exemplo, e menos desses invasores. Nas monoculturas com pouca vegetação nativa, por outro lado, javalis prevalecem”, completa Pônzio.
O estudo faz parte do projeto “Ocorrência de mamíferos e invasão biológica em remanescentes de Cerrado de paisagens agrícolas”, apoiado pela FAPESP e coordenado por Adriano Garcia Chiarello, professor da FFCLRP-USP que orientou o mestrado de Pônzio.
“Na maior parte das propriedades da área estudada nem sequer se cumpre o Código Florestal”, conta Chiarello. A lei determina a conservação de 20% de vegetação nativa em propriedades no Cerrado, mais as áreas de preservação permanente (APPs), como margens de rio e topos de morro.
Segundo o pesquisador, mesmo que a regra fosse cumprida, essa porcentagem não seria suficiente para a manutenção da fauna e de serviços ecossistêmicos. Pesquisas de outros grupos mostraram que são necessários pelo menos 35% a 40% de vegetação nativa para a manutenção da biodiversidade e dos serviços associados.
Como era esperado, a cobertura de vegetação nativa foi o fator que mais influenciou a quantidade de espécies de mamíferos nativos, como a onça-parda e o lobo-guará. No entanto, essas são espécies generalistas, mais adaptáveis a áreas degradadas. Mamíferos históricos do bioma, como a onça-pintada, o tatu-canastra e a queixada, foram extintos na região.
A vegetação nativa também foi o fator que mais contribuiu para diminuir a quantidade de espécies invasoras, como o cachorro doméstico e a lebre-europeia, mas principalmente os javalis.
De acordo com os resultados, os javalis, suínos trazidos para o Brasil para criação que se tornaram pragas agrícolas, são mais detectados em áreas com pouca vegetação nativa dominadas por monoculturas agrícolas, como a cana-de-açúcar.
Diante da degradação e da perda de espécies, a diversificação de lavouras mostrou-se como um fator que ameniza a falta de vegetação nativa. Assim, áreas agrícolas mais diversas, como pequenas propriedades focadas na agricultura familiar e sistemas agrossilvipastoris, podem contribuir para sustentar uma riqueza maior de espécies nativas e menor de exóticas.
“Este trabalho sugere que talvez seja o caso de nossas políticas públicas não se concentrarem apenas no desmatamento, mas também na simplificação da paisagem. Para além do controle do desmatamento, importa muito o que se faz naquela área que antes era de Cerrado”, analisa Renata Pardini, professora do IB-USP e coordenadora do estudo.
Pardini cita o Programa Refloresta SP, da Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística do Estado, regulamentado em 2022. A política busca promover ganhos econômicos associados aos ecológicos, promovendo sistemas agroflorestais, florestas multifuncionais e sistemas silvipastoris biodiversos.
O programa, em parceria com o BIOTA Síntese, um Centro de Ciência para o Desenvolvimento da FAPESP sediado na USP, visa compor áreas com espécies nativas e não nativas, trazendo renda para os produtores rurais e fornecendo serviços ecossistêmicos importantes, inclusive para as lavouras tradicionais.
Os pesquisadores destacam a importância da manutenção e criação de áreas legalmente protegidas de Cerrado, que representam menos de
20% no Estado. Na região analisada, a maior unidade de conservação é a Estação Ecológica Jataí, com pouco mais de 9 mil hectares.
“Não estamos sugerindo que uma agricultura diversificada compensaria os danos ambientais do desmatamento e da monocultura. Nossos dados mostram que ela é importante, mas não substitui o papel da vegetação nativa”, conclui Pônzio.
O estudo contou com apoio da FAPESP por meio de bolsa de doutorado para Nielson Pasqualotto, que fez estágio na Colorado State University, nos Estados Unidos. Marina Zanin, bolsista de pós-doutorado no IB-USP, também foi coautora do trabalho.
Fonte: Agência FAPESP
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